Lugar de falar… qual lugar ? Uma breve reflexão sobre a Covid 19

Maria Ercilia Mendonça Maia[1]


Nesses tempos que vivemos, por sinal, bastante difíceis, está em vigor a expressão “lugar de fala”, e de fato considero que tem questões que somente quem vivência tem condições de falar, falar de qual lugar?

Todos estamos vivendo uma pandemia no Brasil, mas ela não atinge a todos da mesma forma, não podemos ser inocentes e dizer que o Covid 19 atinge a periferia da mesma forma que os lugares onde as classes médias moram.

Como moradora de uma comunidade localiza em um bairro da classe média de Fortaleza, posso dizer que a Covid 19 nos atinge de forma diferente, somos todos moradores do importante bairro de Fátima, somos todos abençoados por Nossa Senhora de Fátima, mas nem todos têm o mesmo acesso à saúde, mas nem todos têm o “direito” ao isolamento social. Sim, o isolamento social, colocando como dever na verdade é um direito, um direito que nem todos têm, é que nos, os moradores da comunidade Aldaci Barbosa que se localiza dentro do imponente bairro de Fátima, não temos esse direito.

Como ficar em isolamento social quando se mora 9 pessoas em uma casa de 42m2? Como ficar em isolamento social quando seu pedido de beneficio emergencial foi negado apesar de você e seu companheiro estarem desempregados há anos? Como ficar em isolamento social quando se é mãe solo, se recebe Bolsa Família, se tem 3 filhos e seu beneficio emergencial foi negado?  Esses são alguns dos relatos que recebo todos os dias, em meio a pedidos de socorro.

Esses relatos são facilmente comprovados quando vimos os dados de casos e mortes por Covid 19 em Fortaleza, esses dados deixam claro que são os mais pobres que estão morrendo, porque também são essas pessoas que trabalham nos mercantis, no transporte coletivo, nas farmácias, na limpeza dos hospitais, postos de saúde e agora com a reabertura da economia, nas lojas, na construção civil. São os mais pobres que estão morrendo e por isso que a reabertura da economia já começou mesmo com os casos ainda subindo.

Posso falar como meu “lugar de fala”, como alguém que está nesse momento sentado no seu quarto, na sua comunidade, como alguém que sabe que são ações coletivas como o Ser Ponte que estão nos ajudando a viver nas comunidades nesses meses de pandemia. Desde muito cedo fui ensinada pelos meus pais que viver em comunidade significava lutar para ter uma vida digna, para ter acesso a políticas públicas, enfim, lutar pra ter direito a ter direito.

[1] Maria Ercilia Mendonça Maia,moradora da Comunidade Aldaci Barbosa em Fortaleza-CE, militante social da luta pela Moradia Digna,  Assistente Social, especialista em política social e legislação social