Em 2024, a Prefeitura de João Monlevade repassou à empresa Enscon Viação o montante de R$ 4.478.515,30, conforme consta no Portal da Transparência do Município. O valor foi destinado à manutenção da tarifa em R$ 4,00 para pagamento em dinheiro e R$ 3,80 no cartão eletrônico. Embora apresentado como um benefício à população, esse modelo tarifado levanta sérias dúvidas sobre sua eficiência, justiça e transparência.
Enquanto isso, o programa Tarifa Zero, implantado em 23 de julho de 2022, vinha beneficiando diariamente cerca de 1.725 pessoas nas linhas 42 e 43, segundo o portal Notícia1.com. Entre julho e dezembro de 2022, o programa transportou 277.762 passageiros gratuitamente.
Agora, vamos aos números: considerando o valor do repasse à Enscon e a tarifa cheia de R$ 4,00, seria possível custear aproximadamente 1.119.629 passagens. Isso significa que o subsídio poderia ter coberto quase quatro vezes mais o número de passagens oferecidas pelo Tarifa Zero no mesmo período.

No entanto, o problema central não está apenas na comparação entre subsídio e gratuidade parcial. O maior equívoco está no modelo adotado em Monlevade, que continua sendo baseado em tarifas por passageiro, quando deveria seguir a lógica do pagamento por quilômetro rodado, como já ocorre em diversas cidades brasileiras. Este modelo, além de mais transparente, permite controle público, fiscalização mais precisa e evita distorções.
Segundo dados oficiais, a quilometragem anual registrada nas linhas beneficiadas pelo Tarifa Zero é de 135.668 km. Com base no repasse feito, o custo chega a R$ 33,01 por quilômetro rodado — um valor considerado extremamente elevado. Para se ter uma base comparativa, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) estipula o valor de R$ 9,83 por km para o transporte rodoviário de cargas. Mesmo reconhecendo que o transporte urbano possui especificidades, a diferença é gritante.

A falta de critérios técnicos públicos para os cálculos, somada à ausência de transparência nos contratos e prestações de contas, reforça a urgência de uma auditoria independente, que revise os valores pagos e investigue possíveis superfaturamentos.
Apesar disso, a Câmara Municipal enviou mensagem ao Executivo sugerindo a ampliação do Tarifa Zero aos domingos — justamente o dia da semana em que a população menos utiliza o transporte coletivo. Essa proposta tende, na prática, a beneficiar ainda mais a empresa concessionária, uma vez que, para manter a gratuidade, seria necessário ampliar também o subsídio já milionário, sem qualquer estudo técnico que comprove a necessidade da medida ou seu impacto real para a coletividade.
Assim, o município segue adotando um modelo que privilegia o repasse de recursos públicos a uma empresa privada, com pouca transparência, sem controle social e sem compromisso com a eficiência do serviço. João Monlevade precisa, urgentemente, repensar seu sistema de transporte coletivo. A adoção de um modelo por quilômetro rodado, com regras claras, metas de desempenho e prestação de contas acessível à população, seria um passo fundamental rumo à justiça social, ao uso responsável dos recursos públicos e à valorização de um transporte realmente público.